CONVITE

O fim último de Deus na criação, redenção e san- tificação nossa é a sua glória eterna. Fomos criados, redimidos e santificados para glorificar a Deus nesta vida e na eternidade. Deus dispôs tudo de tal maneira que as criaturas (anjos e homens) encontrem a sua felicidade em glorificá-lo. A preparação mais direta para a entrada no céu consiste em viver o ensinamento de são Paulo: “Tudo o que fizerdes, fazei-o  para  a  glória  de Deus”.

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Esta deve ser a primeira e constante preocupação de quem aspira à santidade. É preparar a vida celeste.

O meio comum a todos e necessário para chegar a viver a nossa felicidade eterna é a santificação de todo o nosso ser. É o que se realiza vivendo em Cristo Jesus: “Nisto se manifestou o amor de Deus por nós: Deus enviou o seu Filho Unigênito ao mundo para que vivamos por ele” (1Jo 4,9). Ele é a videira, e o ser humano é um ramo; se o ramo vive da linfa santificadora de Jesus Cristo, produzirá frutos de vida eterna; separado da videira Jesus, seca e será lançado ao fogo (cf. Jo 15,1-8).

Esta união com Cristo deve ser plena, me- diante a fé na sua palavra, a sua imitação e a união com ele, o qual é a vida da nossa alma por meio da graça.

A vida presente é preparação de todo o nosso ser –  mente,  vontade,  coração e corpo – para o paraíso. A nossa morada fixa está na eternidade: ou salvos para sempre com Deus, ou condenados a estar para sempre longe dele.

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A salvação é incumbência absolutamente necessária, única. Neste mundo somos postos à prova; bem-aventurada a pessoa que, supe- rando-a, recebe a coroa. E para superar a prova devemos conhecer, servir e unir-nos a nosso Senhor, amando-o de todo o coração e sobre todas as coisas, porque Deus é o sumo bem e a nossa eterna felicidade. Tudo o que temos nes- ta vida, dons naturais e sobrenaturais, constitui o meio para conseguirmos a salvação. Eis as palavras do divino Mestre: “De que adianta alguém ganhar o mundo inteiro, se arruinar a própria vida?” (Mt 16,26).

O aspirante à vida religiosa, e todo aquele que deseja alcançar o paraíso, deve empenhar-se ardorosamente no trabalho da própria santificação.

E quem professou os votos religiosos as- sumiu a obrigação estrita de tender à perfeição, seja pelos deveres contraídos, seja pela abundância de meios que a bondade divina lhe concede.

É necessário um trabalho espiritual intenso e constante que, embora árduo, é o mais nobre

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e consolador. Tendo presente a situação do homem após o pecado das origens, esse trabalho tem dois objetivos:

  1. Eliminar o mal que provém das más inclinações interiores e da ação do maligno e do mundo, por meio do combate espiritual, da abnegação e da fuga dos perigos e do pecado: “Evita o mal”.
  2. Dirigir todo o ser à união sobrenatural com A pessoa toda deve orientar-se para Deus e unir-se a ele: a mente, com uma fé viva; a vontade, com uma vida virtuosa; e o coração, com sentimentos sobrenaturais: “Faze o bem”.

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Em Deus se encontram todos os bens para a vida presente e para a eternidade.

Nossa união com Deus realiza-se por meio de Jesus Cristo, no Espírito Santo.

Jesus é o Mediador entre Deus e o homem. Ele cumpriu a sua missão com seus três ofícios principais: de Mestre e Doutor, porque ele é a Verdade; de Rei e Exemplar, porque é o Caminho; de Sacerdote e Hóstia, porque é a Vida.

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O divino Mestre afirmou: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida” (Jo 14,6). Isto é: “Eu sou o Caminho que deves seguir, a Verdade que deves crer, a Vida que deves esperar” (Imitação de Cristo 3,56). Ele vive na pessoa em estado de graça, e a pessoa em estado de graça vive nele: para a glória de Deus e a paz dos homens. Jesus Cristo realiza essa obra em favor de cada pessoa, em particular por meio da Igreja. Ela prega as mesmas verdades, guia os fiéis, governando-os com amor, e comunica-lhes a graça, santificando-os com os sacramentos. Dessa maneira podemos viver em Jesus Cristo na terra, para depois vivermos eternamente felizes no céu.

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Perde-se quem se afasta de Deus, cometendo o pecado, que é “afastamento de Deus e apego às criaturas”: a consequência do pecado é a ruína espiritual. Ao contrário, salva-se quem procura a Deus: “desapego das criaturas e aproximação de Deus”.

Os nossos propósitos e o verdadeiro trabalho espiritual devem ter uma parte negativa e

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outra positiva. Por exemplo: lutar contra a so- berba para substituí-la pela humildade; lutar contra a concupiscência da carne para substituí-la pela mortificação e pela castidade; lutar contra a avareza e o espírito de comodidade para substituí-los pela caridade e pela pobreza. Trata-se de nos despojarmos do velho Adão, para nos vestirmos do homem novo, Jesus Cristo (cf. Ef 4,24).

Embora existam na pessoa muitas paixões e inclinações más, há sempre uma predominante: o verdadeiro trabalho espiritual consiste em conhecê-la, combatê-la e colocá-la a serviço de Deus, com a prática da virtude contrária.

É sábio, fácil e eficaz dividir o trabalho espiritual e dedicar-se a um ponto particular.

Esse trabalho deve ser organizado:

  1. Nos exercícios espirituais e no retiro mensal: a pessoa se examina e, seguindo o conselho do confessor, escolhe o propósito
  1. Nos exames de consciência – preventivo, particular e geral – que se fazem todos os dias; bem como no exame semanal, mensal e
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  1. Durante o dia, exercer constante vigilância sobre os pensamentos, sentimentos e atos, a fim de agir contra a má inclinação: “Age contra”.
  1. Renovar o propósito todos os dias na meditação, na missa e na comunhão, na adoração eucarística e no rosário, rezando incessantemente para obter a vitória.

O exame de consciência tem como fruto principal o conhecimento de nós mesmos.

A meditação visa particularmente fortalecer a vontade e renovar os propósitos.

A comunhão aumenta em nós a graça e estabelece a união com Jesus Cristo.

A leitura espiritual e as conferências têm por finalidade especial a instrução da mente.

A adoração a Jesus eucarístico e a santa missa têm três frutos em vista: para a mente, a vontade e o coração. Na prática, porém, jamais estão completamente separados os três frutos da instrução, do conforto e da graça. E não convém preocupar-se em querer distingui-los: o ser humano é sempre uno, e a perfeição está na união com Jesus Cristo.

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Para que seja completo e, por meio de Jesus Cristo, nos una a Deus, qualquer propósito deve abranger a mente, a vontade e o coração. Se, por exemplo, se quer substituir a soberba pela humildade, convém cultivar na mente, segundo a fé, pensamentos humildes; com a vontade, seguir a Jesus em sua vida humilde; com o coração, cultivar sentimentos de hu- mildade; e pedir com a oração essa graça tão preciosa. Da mesma forma em se tratando de todas as demais virtudes. Destarte a pessoa afastará do mal a mente, a vontade e o coração; e em Jesus Cristo se unirá totalmente a Deus, sumo bem e eterna felicidade.

Com efeito, as várias devoções são orientadas para a verdadeira e única devoção a Jesus Mestre, Caminho, Verdade e Vida. As várias práticas e devoções são meios para viver em Jesus Cristo; e por Jesus Cristo e com ele glorificar a Deus. Esta é a vida eterna, antecipada na terra e plenamente feliz no céu.

Incorporados a Jesus Cristo, com ele viveremos no céu. O paraíso é prêmio completo: para a mente pela visão, para a vontade pelo

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amor beatífico, para o coração pelo júbilo eterno, e para o corpo pela glorificação. “Eu preparo para vós o Reino, como meu Pai o preparou para mim”, disse o divino Mestre (Lc 22,29).

E são Paulo afirma: “O próprio Espírito se une ao nosso espírito para testemunhar que somos filhos de Deus. E, se somos filhos, somos também herdeiros: herdeiros de Deus e co-herdeiros de Cristo, pois sofremos com ele, para também sermos com ele glorificados. Penso, com efeito, que os sofrimentos do tempo presente não têm proporção com a glória que deverá revelar-se em nós” (Rm 8,16-18).

 

Padre Tiago Alberione

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